Assim sendo, no Brasil, dadas as particularidades históricas da transição, a tríade da memória (verdade, justiça e reparação) não se completa. Temos “meias verdades”, porque muitas mortes e desaparecimentos ainda não foram esclarecidos e nenhuma política de justiça efetivada. Portanto, os embates pela memória no Brasil apresentam-se em meio a um paradoxo: a condenação moral da ditadura sem a condenação jurídica dos agentes de Estado.
Verifica-se, ainda que as políticas de memória e o lugar do testemunho se configuram de maneiras plurais, a depender do processo de transição de cada país. O passado não tem um sentido fixo, pelo contrário, está sujeito às disputas de interpretações. Segundo Jelin (2002), as memórias são dinâmicas, mudando ao longo do tempo, dentro de uma lógica de manifestação e elaboração do trauma das estratégias políticas de vários atores, a partir de questões levantadas para inviabilizar a sua repetição.
Na Argentina, como explica Sarlo (2007), antes da transição democrática, mas intensamente a partir dela, ocorreu uma vasta reconstituição de atos de violência estatal por vítimas testemunhas numa dimensão jurídica indispensável à democracia. Assim, esses testemunhos além de terem sido a base probatória para a condenação do terrorismo de Estado, eles também passaram a ser considerados importantes ferramentas de análises fora da dimensão jurídica. Eles oportunizaram recuperar o passado repressivo para construir hipóteses que viabilizaram várias análises posteriores.